Capítulo do livro - LER E ESCREVER NA ESCOLA: O REAL, O POSSÍVEL E O NECESSÁRIO. Delia Lerner



Capítulo 1: LER E ESCREVER NA ESCOLA: O REAL, O POSSÍVEL E O NECESSÁRIO

Livros Ler e Escrever na Escola - O Real, o Possível e o Necessário - Delia Lerner De Zunino (8573079576)


LER E ESCREVER NA ESCOLA: O REAL, O POSSÍVEL E O NECESSÁRIO. Delia Lerner

 LERNER, DELIA. LER E ESCREVER NA ESCOLA: O REAL, O POSSÍVEL E O NECESSÁRIO. PORTO ALEGRE: ARTMED, 2002 

Este livro traz a dimensão de trabalhar na escola as práticas de leitura e escrita como objetos de ensino isto é a transformação da prática docente na alfabetização básica. 

Capítulo 1: LER E ESCREVER NA ESCOLA: O REAL, O POSSÍVEL E O NECESSÁRIO 

O que se põe como necessário para nós é o enfrentamento do real no intuito de formar alunos praticantes da cultura escrita. Para tanto é necessário redimensionar o ensino das práticas de leitura e escrita como práticas sociais. Precisamos formar uma comunidade de leitores e escritores. 

Para esse redimensionamento é preciso olhar e analisar cinco questões presentes na escola: 

1-A escolarização das práticas de leitura e escrita e de escrita proporciona problemas intensos; Para trabalhar na escola as práticas sociais reais é necessário uma mudança no processo de democratização do conhecimento e da função implícita de reproduzir a ordem social estabelecida. 

2-Os fins que se notam na escola ao ler e escrever são diferentes dos que dirigem a leitura e a escrita fora dela – não há função social real; Para uma aprendizagem significativa é necessário aliar os propósitos didáticos e os propósitos comunicativos de ler e escrever. 

3-A inevitável distribuição dos conteúdos no tempo pode levar a parcelar o objeto de ensino; As práticas de leitura e escrita são totalmente indissociáveis que sobrevivem a divisão e à sequenciação dos conteúdos. 

4-A necessidade institucional de controlar a aprendizagem leva a pôr em primeiro lugar os aspectos mais compreensíveis da avaliação; 

5-A maneira como se distribuem os direitos e obrigações entre o professor e os alunos, determina quais são os conhecimentos e estratégias que as crianças têm ou não a oportunidade de exercer e, portanto quais poderão ou não aprender. Como o dever do professor é avaliar, o aluno tem poucas oportunidades de auto controlar o que compreendem ao ler e de auto corrigir seus escritos. O POSSÍVEL a fazer é aliar os propósitos da instituição escolar aos propósitos educativos de formar leitores e escritores, criando condições didáticas favoráveis a uma versão escolar mais próxima da versão social dessas práticas. Para esse fim é necessário: a)A elaboração de um projeto curricular; b)Articulação dos objetivos didáticos com objetivos comunicativos, essa articulação pode efetivar-se através de uma modalidade organizativa sabida que são os projetos de produção-interpretação; c)Os projetos orientam as ações para a realização de um objetivo compartilhado. É imprescindível compartilhar a função avaliadora. 

Capítulo 2 : PARA TRANSFORMAR O ENSINO DA LEITURA E DA ESCRITA 

Para que a escola produza transformações substanciais com o objetivo de tornar as práticas de leitura e escrita significativas: Formar praticantes da leitura e da escrita e não apenas decifradores do sistema de escrita. Formar seres humanos críticos aptos de ler entrelinhas e de adotar uma posição própria. Formar pessoas desejosas de embrenhar-se em outros mundos possíveis que a leitura oferece, disposta a identificar com o semelhante ou solidarizar-se com o desigual e hábil de admirar a qualidade literária. Orientar ações para constituição de escritores, de pessoas que saibam informar-se por escrito com os demais e com elas mesmas. Atingir produções de língua escrita conscientes da pertinência e da importância de dar certo tipo de mensagem em determinado tipo de posição social. O desafio é que as crianças manejem com eficácia os diversos escritos que circulam na sociedade. Obter que a escrita aceite de ser na escola apenas um objeto de avaliação para se constituir num objeto de ensino. Gerar a descoberta do emprego da escrita como instrumento de raciocínio sobre o próprio pensamento, como recurso para organizar e reorganizar o próprio conhecimento.
Resistir a discriminação que a escola age atualmente, não só quando cria fracasso explícito daqueles que não conseguem alfabetizar, como também quando impede aos outros que aparentemente não fracassam, chegar a ser leitores e produtores de textos competentes e independentes. O desafio é combater a discriminação unir esforços para alfabetizar todos os alunos assegurando a apropriação da leitura e escrita como ferramentas essenciais ao progresso cognoscitivo e der crescimento pessoal. 

É POSSÍVEL MUDANÇA NA ESCOLA?

 A instituição sofre uma verdadeira tensão entre dois pólos contraditórios: A rotina repetitiva e a moda são obstáculos para a verdadeira mudança. As mudanças acima apontadas só serão possíveis através da capacitação qualitativa dos professores e da instituição escolar.Será preciso estudar os mecanismos ou fenômenos que ocorrem na escola e impedem que todas as crianças se apropriem dessas práticas sociais de leitura e escrita. 

ACERCA DO “CONTRATO DIDÁTICO” 

O contrato didático serve para deixar claro aos professores e alunos suas parcelas de responsabilidades na escola e na relação ensino/aprendizagem. Estabelecer objetivo por ciclo para diminuir a fragmentação do conhecimento; Atribuir maior visibilidade aos objetivos gerais do que aos específicos; Evitar o estabelecimento de uma correspondência termo a termo entre os objetivos e atividades; Ultrapassar o tradicional isolamento entre a “apropriação do sistema de escrita” e “”desenvolvimento da leitura e escrita” Vale lembrar que as mudanças são possíveis se o coletivo escolar assim o fizer. A escola deve se tornar um ambiente de formação da comunidade leitora e escritora. No caso da alfabetização, duas questões são fundamentais: assegurar a formação de leitores e produtores de textos e considerar como eixo de formação o conhecimento didático 

CAPÍTULO 3: 

APONTAMENTOS A PARTIR DA PERSPECTIVA CURRICULAR 

Os documentos curriculares devem aliar o objeto de ensino com as possibilidades do sujeito de atribuir um sentido pessoal a esse saber. Não devem se caracterizar documentos prescritivos. Os documentos curriculares devem ter como foco a adoção de decisões acerca de conteúdos que devem ser ensinados: importante decidir o que vai se ensinar com vistas no objeto social e com qual hierarquização, isto é, o que é prioritário. O que deve permear essas escolhas são os verdadeiros objetivos da educação: incorporar as crianças à comunidade de leitores e escritores, e formar cidadãos da cultura escrita. Lerner aponta que a leitura não deve ser sem um propósito específico. A leitura e a escrita nascem sempre interpoladas nas relações com as pessoas, supõem intercâmbios entre leitores acerca dos textos: interpretar, indicar, contestar, intercambiar e outros. Esse é o verdadeiro sentido social dessa prática. Os comportamentos do leitor e do escritor são conteúdos e não tarefas, porque são aspectos do que se espera que os alunos aprendam. Comportamento leitor: explanar, recomendar, repartir, confrontar, discutir, antecipar, reler, saltar, identificar, adaptar e outros. Comportamento do escritor: planejar, textualizar, revisar. A escola precisa permitir o acesso aos textos através da leitura em suas diferentes funções. 

CAPÍTULO 4: 

É POSSIVEL LER NA ESCOLA? 

Na escola é necessário trabalhar a leitura com duplo propósito: o propósito didático e o propósito comunicativo. O primeiro propósito corresponde a ensinar certos conteúdos constitutivos da prática social da leitura, com a finalidade de que o aluno possa utilizá-la no futuro, em situações não-didáticas. O segundo propósito é da perspectiva do aluno. Como trabalhar os dois propósitos: Através de projetos que aliam a aprendizagem a uma função real para os alunos. Ler para definir um problema problema prático; Ler para se informar de um tema interessante; Ler para escrever ou produzir um texto; Ler para buscar informações específicas; Ler para escolher, entre os contos, poemas ou romances.

 GESTÃO DO TEMPO, APRESENTAÇÃO DE CONTEÚDOS E ORGANIZAÇÃO DAS ATIVIDADES 

É fundamental para o trabalho com essa diferente visão produzir uma transformação qualitativa na utilização do tempo didático. Manejar com flexibilidade a duração das situações didáticas e tornar possível a retomada dos próprios conteúdos em diferentes ocasiões e a partir de perspectivas diversas. As práticas sociais de leitura e escrita tornam-se mais significativas e têm seus objetivos cumpridos ao organizar a rotina dentro das modalidades didáticas: Projetos – apresentam assuntos nos quais a leitura ganha sentido cujos múltipos aspectos se articulam para a elaboração de um produto tangível. Atividades Habituais – repetem-se de forma metódica previsível uma vez por semana ou por quinzena, durante vários meses ou ao longo de todo ano escolar. Sequências de atividades – são dirigidas para se ler com crianças diversos exemplares de um mesmo gênero de
gêneros diferentes obras de um mesmo autor ou diferentes textos sobre um mesmo tema; incluem situações de leitura cujo único propósito explícito e compartilhado com as crianças, é ler. Situações independentes: estas dividem-se em situações ocasionais e situações de sistematização 

ACERCA DO CONTROLE: AVALIAR A LEITURA E ENSINAR A LER 

A avaliação é fundamental no processo escolar, pois possibilita verificar se os alunos aprenderam o que o professor se propôs ensinar. Para evitar que a pressão da avaliação se torne um obstáculo para a formação de leitores, é obrigatório, por um lado por em primeiro plano os propósitos referentes à aprendizagem de tal modo que não se subordinem ao controle e por outro lado criar modalidades de trabalho em o controle seja responsabilidade do aluno. O professor como um ator no papel de leitor O professor como leitor proficiente é um modelo fundamental para os alunos. É necessário que leia e informe aos alunos tudo que é pertinente à leitura,: estratégias eficazes quando a leitura é compartilhada, como delegar a leitura, individual ou coletiva, às crianças , o professor está ensinando a ler . Ele é modelo de leitor das crianças Nesta capítulo a autora conclui: É possível sim ler na escola se: se consegue produzir uma mudança qualitativa na gestão do tempo didático, se se concilia a necessidade de avaliar com as prioridades do ensino e da aprendizagem, se se redistribuem as responsabilidades de professor e alunos em relação à leitura para tornar possível a formação de leitores autônomos, se se desenvolvem na sala de aula e na instituição projetos que dêem sentido à leitura, que promovam o funcionamento da escola como uma microssociedade de leitores e escritores em que participem crianças, pai e professores, então..... sim é possível ler na escola. 

Capítulo 5: 

O PAPEL DO CONHECIMENTO DIDÁTICO NA FORMAÇÃO DO PROFESSOR 

A conceitualização da especificidade do conhecimento didático e a reflexão sobre a prática são apontadas pela autora como dois fatores importantes no trabalho de capacitação de professores. O saber didático ainda que se apóie em saberes produzidos por outras ciências, não pode ser deduzido simplesmente deles é também o resultado do estudo sistemático das interações que se produzem entre professor e aluno, os alunos e o objeto de ensino, é produto da análise das relações entre ensino e aprendizagem de cada conteúdo específico, é elaborado através da investigação rigorosa do funcionamento das situações didáticas. O registro realizado pelo professor é fundamental para dar vida ao conhecimento didático: quando se torna objeto de reflexão faz da prática do professor uma prática consciente e possível de mudança. Paulo Freire: 

PEDAGOGIA DA AUTONOMIA PEDAGOGIA DA AUTONOMIA SABERES NECESSÁRIOS À PRÁTICA EDUCATIVA 

CAPíTULO 1 - 

Não HÁ DOCÊNCIA SEM DISCÊNCIA 

o autor ressalta a importância da reflexão crítica na formação docente na prática educativa. 

 Como exemplo cita o ato de cozinhar , que exige o conhecimento do fogão, da regulagem da chama, da harmonização dos temperos. Mas é a prática de cozinhar, ratificando alguns daqueles saberes e retificando outros, que transforma o novato em cozinheiro. 

O autor alinha e discute saberes fundamentais à prática educativo-critica ou progressista que considera obrigatórios na organização dos programas de formação docente: » Ensinar inexiste sem aprender e vice- versa. Quem ensina aprende ao ensinar e quem aprende ensina ao aprender. Foi aprendendo socialmente, ao longo dos séculos, que historicamente o Homem descobriu que era possível ensinar usando maneiras, caminhos e métodos. Não há validade no ensino, se este não resulta em aprendizado. » Ensinar é um processo que deve deflagrar no aprendiz uma curiosidade crescente que poderá torná-lo mais e mais criador. Caso o educando mantenha viva em si a curiosidade, a rebeldia, a capacidade de arriscar-se, de aventurar-se, poderá ficar imune ao ensino "bancário". Fazem parte da força criadora do aprender a comparação, a repetição, a constatação, a dúvida rebelde, que superam o falso ensinar; »Ensinar exige trabalhar com os educando. a rigorosidade metódica com que devem se aproximar do conhecimento. Não se trata apenas de transmitir o conteúdo, mas faze-lo de forma critica. Exige que os educadores sejam criadores, instigadores, inquietos, humildes e persistentes. - » Ensinar exige pesquisa.: Faz parte da natureza da prática docente a indagação, a busca, a pesquisa. É preciso que em sua formação permanente, o professor assuma como pesquisador » Ensinar exige respeito aos saberes dos educandos .construídos na prática comunitária. Exige também discutir com os alunos a razão de ser desses saberes, em relação com o ensino dos conteúdos. Ex.:.aproveitar a experiência que têm os alunos de viver em áreas das cidades descuidadas pelo poder público para discutir a poluição dos riachos, os lixões, os riscos à saúde que ocasionam. » Ensinar exige criticidade.:.A passagem da curiosidade ingênua à criticidade não se dá automaticamente. Uma das tarefas da prática educativo -
progressista é desenvolver a curiosidade crítica, insatisfeita, indócil. Com ela podemos nos defender do excesso de "racionalidade" do nosso tempo altamente tecnológico. » Ensinar exige estética e ética. O ensino dos conteúdos não é puro treinamento técnico, não pode dar-se alheio à formação moral do educando. Exige profundidade e não superficialidade na compreensão te interpretação dos fatos. » Ensinar exige que as palavras sejam acompanhadas pelo exemplo. Pensar certo é fazer certo. O professor que rea1mente ensina, descarta o "faça o que eu mando e não o que eu faço". » Ensinar exige risco, aceitação do novo e rejeição a qualquer forma de discriminação. Lembrando que o velho que é válido e que marca sua presença no tempo, continua novo. Quanto ao preconceito de raça de gênero e classe,- ofende a substantividade do ser humano e nega a democracia.

 I » Ensinar exige reflexão crítica sobre a prática.

_Na educação, a reflexão critica sobre a prática impede que a teoria se torne blablablá e a prática se torne ativismo. Envolve o movimento dinâmico entre o fazer e o pensar sobre o fazer. A prática docente espontânea e "desarmada" produz um saber ingênuo feito só de experiência. Através da reflexão sobre a prática, a curiosidade ingênua, percebendo-se .como tal, vai se tornando crítica. Na sua formação docente inicial é preciso que o futuro professor saiba que o pensar certo não é um presente dos deuses, nem de iluminados intelectuais e nem se encontra pronto nos manuais. Ele tem que ser construído pelo próprio aprendiz em comunhão com o professor formador. Na formação permanente dos professores, o momento fundamental é o da reflexão crítica sobre a prática. Após assumir que a minha prática não condiz, devo ser capaz de mudar. 

Ex.: o simples fato de o fumante assumir que o cigarro ameaça a sua vida não significa parar de fumar; ele deve fazer a ruptura do fumo e assumir novos compromissos. O emocional ( a legítima raiva do fumo ) é um elemento fundamental na mudança. Na educação, a justa raiva contra as injustiças, contra a deslealdade, o desamor, a exploração e a violência tem um papel altamente formador. » Ensinar exige o reconhecimento e a assunção da identidade cultural.-Uma das funções da educação crítica é dar condições aos alunos que se assumam como ser social e histórico: pensante, transformador, criador, realizador de sonhos. Isso se dá na relação uns com os outros e com o professor. Esta experiência histórica, política e social não se dá ao largo das forças que a favorecem ou daquelas que lhe são obstáculo. Os gestos de aprovação, de respeito aos sentimentos, às emoções do aluno, o cuidado com o espaço escolar ajudarão o educando a assumir-se a si mesmo e à sua classe social.. 

CAPÍTULO 2-

 ENSINAR NÃO é TRANSFERIR CONHECIMENTO ... 

Mas criar as possibilidades para a sua própria produção ou a sua construção. » Ensinar exige consciência do inacabamento do ser humano. Onde há vida, esta não está acabada. Daí ser imperiosa a prática formadora carregada de ética e de esperança, pois é possível intervir e melhorar o "destino". Disso, o educador consciente não pode fugir. » Ensinar exige o reconhecimento de ser condicionado.:.Como ser inacabado e consciente da sua inconclusão, o ser humano é submetido a condições, obstáculos para evoluir. Ele deve se inserir num movimento de busca constante e ter a consciência de que esses obstáculos não são eternos nem intransponíveis. Ex.: temos que nos opor ao fatalismo do discurso neoliberal , quando afirma que nada se pode fazer contra o desemprego. » Ensinar exige respeito à autonomia do ser do educando. O respeito à autonomia de cada um não é um favor, mas um imperativo ético. O professor que desrespeita o gosto estético do aluno, sua linguagem, sua inquietude, que ironiza o aluno e o manda "se colocar no seu lugar" pratica uma transgressão. Também rompe com a ética aquele professor que não cumpre o seu dever de colocar limites à liberdade do aluno ou que se furta do seu dever de ensinar.
» Ensinar exige bom senso. E o bom senso que me faz analisar a todo instante a minha prática e a tomar as decisões. É o bom senso que adverte o professor de que:Exercer a autoridade tomando decisões, orientando atividades, cobrando a produção individual e coletiva da classe não é sinal de autoritarismo. Não aceitar o trabalho do aluno fora do prazo, apesar das justificativas que apresentou serem convincentes é insensibilidade. É negativo, da mesma forma, o desrespeito pleno pelos princípios reguladores da entrega dos trabalhos . Há algo a ser compreendido no comportamento do aluno assustado, distante, medroso, escondendo-se até de si mesmo. » Ensinar exige humildade, tolerância e luta em defesa dos direitos dos educadores. A luta em favor da educação e dos educadores passa pela luta por salários dignos. O descaso do poder público nesse sentido é tanto que podemos correr o risco de cruzar os braços achando que "não há o que fazer". Entretanto, uma das formas de luta é a nossa recusa de transformar a nossa prática docente em um "bico" ou de exercê-Ia como prática afetiva de "tia ou tio". É como profissionais idôneos que se organizam politicamente que está a força dos educadores. Os órgãos de classe deveriam priorizar o empenho de formação permanente dos quadros do magistério como tarefa política e repensar a eficácia das greves. Não é parar de lutar, mas reinventar a forma histórica de lutar. » Ensinar exige apreensão da realidade. Se o professor tem uma prática progressista, sua prática não pode ser neutra. Deve estar atento ao fato de que seu trabalho pode ser um estimulo à superação. Deve haver o respeito à pessoa que queira mudar ou que se recuse a mudar. Contudo, o professor não deve esconder-lhe a sua postura. Ex.: numa conversa pública, um jovem disse a Paulo Freire: " Não entendo como o senhor defende os sem- terra, no fundo uns baderneiros" . "Pode haver baderneiros entre os sem- terra", respondeu o professor, "mas sua luta é legítima e ética; baderneira é a resistência de quem se opõe a ferro e fogo à reforma agrária". Embora a conversa tenha terminado aí, foi importante que o professor tenha dito o que pensava. » Ensinar exige alegria e esperança. Sem a esperança não haveria a História, mas puro determinismo. A desesperança nos imobiliza. A pessoa progressista que não teme a novidade, que se sente mal com as injustiças, que se ofende com as discriminações, que recusa o fatalismo, deve ser criticamente esperançosa. » Ensinar exige a convicção de que a mudança é possível.=.O educador progressista vê a História como possibilidade e não como determinação. O futuro para ele é problemático, mas não inexorável. Constata o mundo, não para adaptar-se, mas para mudar. . Percebe as resistências das classes populares como manhas necessárias à sobrevivência. Ex.: o sincretismo religioso afro- brasileiro expressa a resistência ou manha com que a cultura africana se defendia do colonizador branco. Uma das questões centrais é evoluir de posturas rebeldes para posturas revolucionárias que nos engajam no processo de transformação do mundo. Não se trata de impor à população oprimida que se rebele para mudar o mundo. Trata-se de, simultaneamente ao trabalho que se realiza - alfabetizar, evangelizar - desafiar os grupos populares a perceberem em termos críticos a violência concreta. Não como destino ou vontade de Deus, mas como algo que pode ser mudado. O poder dominante tenta inculcar no dominado a culpa pela sua situação. Isso deve ser desvelado também. O educador progressista, entretanto, descarta a -tática do "quanto pior melhor"; nem tampouco deixa relegado a um segundo plano o ensino, transformando a classe num "comício-libertador". » Ensinar exige curiosidade. O educador entregue a procedimentos autoritários dificulta o exercício da curiosidade do educando e tolhe sua própria curiosidade. O bom clima pedagógico é aquele em que o educando vai aprendendo na prática que o limite da sua curiosidade e da sua liberdade é a privacidade do outro.formas de autoritarismo e licenciosidade, que precisamos superar principalmente através do diálogo. 

CAPÍTULO 3 - 
ENSINAR É UMA ESPECIFICIDADE HUMANA»
 Ensinar exige segurança, competência profissional e generosidade. Nenhuma autoridade docente se exerce se não existe a competência profissional. O professor deve levar a sério sua tarefa, estudar, se esforçar para estar à altura dela, ou não terá força moral para coordenar as atividades de sua classe. Outra qualidade indispensável à autoridade é a generosidade. Esta descarta tanto a arrogância no trato com “os outros”, como à indulgência macia no trato com “os seus”. cap. 3 cont... ”. O clima de respeito nasce de relações justas, sérias, humildes, generosas, em que a autoridade docente e as liberdades dos alunos se assumem eticamente. » Ensinar exige comprometimento._Não posso ser professor sem me colocar diante dos alunos, sem revelar minha maneira de ser, de pensar politicamente, sem me submeter à apreciação dos alunos. Não posso passar despercebido pelos alunos e isso aumenta em mim os cuidados com o meu desempenho. Minha presença de professor é uma presença política; não posso ser uma omissão, mas um sujeito de opções. » Ensinar exige compreender que a educação é uma forma de intervenção no mundo. Neutra, a educação nunca foi, é, ou será. Exige do professor uma definição, uma tomada de posição. A intervenção, além do conhecimento dos conteúdos bem ou mal ensinados e/ou aprendidos implica tanto o esforço de reprodução da ideologia dominante, quanto o seu desmascaramento. É o aspecto contraditório da educação. Nem somos seres determinados, nem livres de condicionamentos genéticos, culturais, de classe, de gênero, que nos marcam. Do ponto de vista dos interesses dominantes, a educação deve ser prática imobilizadora e ocultadora. Quando a classe dominante é progressista, o é "pela metade". Ex.: o empresariado urbano pode mostrar-se progressista face à reforma agrária, mas retrógrado diante dos interesses do mercado. O educador consciente e critico não atribui a "forças cegas" os danos que a obediência irrestrita à lei do mercado causa aos seres humanos. Reconhece que não há fatalidade no desemprego e na miséria. » Ensinar exige liberdade e autoridade._Para o professor é dificil, muitas
vezes, caminhar com naturalidade entre a autoridade e a liberdade. É importante se estabelecer os limites, sem os quais a liberdade se transforma em licenciosidade. A liberdade amadurece no confronto com outras liberdades, na defesa de seus direitos face à autoridade dos pais, professores, do Estado. Para exercitar a liberdade é preciso aprender a tomar decisões. É decidindo que se aprende a decidir. É correndo o risco e assumindo as conseqüências das decisões que se tomou. Este processo fundamenta a autonomia. Uma pedagogia da autonomia deve estar centrada em experiências estimuladoras da decisão e da responsabilidade, que constroem a liberdade. » Ensinar exige tomada consciente de decisões._O que cabe ao educador consciente de que a educação não é neutra é forjar em si um saber especial, que jamais deve abandonar: se a educação não pode tudo, alguma coisa fundamental a educação pode. Se a educação não é a chave das transformações sociais, não é também simplesmente reprodutora da ideologia dominante. O educador não pode transformar o país, mas pode demonstrar que é possível mudar, dada a importância de sua tarefa político- pedagógica. » Ensinar exige saber escutar._Quem tem o que dizer deve assumir o dever de desafiar quem escuta para que este fale, responda. O educador autoritário comporta-se como proprietário da verdade e discorre sobre ela, numa atitude intolerável. Sua fala se dá num espaço silenciado. Ao contrário, o educador democrático aprende a falar escutando. Está mais interessado em comunicar do que em fazer comunicados, em escutar a indagação, a dúvida, a criação de quem escutou. » Ensinar exige reconhecer que a educação é ideológica. A força da ideologia fatalista é querer convencer os prejudicados das economias submetidas de que a realidade é assim mesmo, de que não há nada o que fazer a não ser seguir a ordem natural dos fatos. Quando o discurso da globalização fala de ética, se refere à do mercado. Não àquela da solidariedade, a favor dos legítimos interesses humanos. A liberdade do comércio não pode estar acima da liberdade do ser humano. .. O progresso científico e tecnológico que não responde aos interesses humanos , perde a sua significação. A todo avanço tecnológico que ameace mulheres e homens de perder o seu trabalho, deveria haver uma resposta imediata. Pois é uma questão ética e política e não só tecnológica. Não se trata de inibir a pesquisa, mas de colocá-Ia a serviço dos seres humanos. Por causa de tudo isso, como professor, deve-se estar atento ao discurso que proclama a morte das ideologias. Este, sim, altamente ideológico, que ameaça anestesiar as mentes, confundir , distorcer a percepção dos fatos.» Ensinar exige disponibilidade para o diálogo nas relações com outros que não fizeram a mesma opção política, ética, estética ou pedagógica, é no respeito às diferenças, na coerência entre o que se diz e o que se faz que se constrói a disponibilidade para o diálogo. Deveria fazer parte da aventura docente a abertura respeitosa ao outro e a reflexão critica conjunta. A razão ética desta abertura possibilita o diálogo. » Ensinar exige querer bem aos educandos: É preciso descartar como falsa a separação entre seriedade docente e afetividade. A prática docente deve ser vivida com alegria, afetividade, emoção e sentimento .. Sem prescindir da formação científica séria, da clareza política, da luta por seus direitos e pela dignidade de sua tarefa.

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