» Ensinar exige bom senso. E o bom senso que me faz analisar a todo instante a minha prática e a tomar as decisões. É o bom senso que adverte o professor de que:Exercer a autoridade tomando decisões, orientando atividades, cobrando a produção individual e coletiva da classe não é sinal de autoritarismo. Não aceitar o trabalho do aluno fora do prazo, apesar das justificativas que apresentou serem convincentes é insensibilidade. É negativo, da mesma forma, o desrespeito pleno pelos princípios reguladores da entrega dos trabalhos . Há algo a ser compreendido no comportamento do aluno assustado, distante, medroso, escondendo-se até de si mesmo. » Ensinar exige humildade, tolerância e luta em defesa dos direitos dos educadores. A luta em favor da educação e dos educadores passa pela luta por salários dignos. O descaso do poder público nesse sentido é tanto que podemos correr o risco de cruzar os braços achando que "não há o que fazer". Entretanto, uma das formas de luta é a nossa recusa de transformar a nossa prática docente em um "bico" ou de exercê-Ia como prática afetiva de "tia ou tio". É como profissionais idôneos que se organizam politicamente que está a força dos educadores. Os órgãos de classe deveriam priorizar o empenho de formação permanente dos quadros do magistério como tarefa política e repensar a eficácia das greves. Não é parar de lutar, mas reinventar a forma histórica de lutar. » Ensinar exige apreensão da realidade. Se o professor tem uma prática progressista, sua prática não pode ser neutra. Deve estar atento ao fato de que seu trabalho pode ser um estimulo à superação. Deve haver o respeito à pessoa que queira mudar ou que se recuse a mudar. Contudo, o professor não deve esconder-lhe a sua postura. Ex.: numa conversa pública, um jovem disse a Paulo Freire: " Não entendo como o senhor defende os sem- terra, no fundo uns baderneiros" . "Pode haver baderneiros entre os sem- terra", respondeu o professor, "mas sua luta é legítima e ética; baderneira é a resistência de quem se opõe a ferro e fogo à reforma agrária". Embora a conversa tenha terminado aí, foi importante que o professor tenha dito o que pensava. » Ensinar exige alegria e esperança. Sem a esperança não haveria a História, mas puro determinismo. A desesperança nos imobiliza. A pessoa progressista que não teme a novidade, que se sente mal com as injustiças, que se ofende com as discriminações, que recusa o fatalismo, deve ser criticamente esperançosa. » Ensinar exige a convicção de que a mudança é possível.=.O educador progressista vê a História como possibilidade e não como determinação. O futuro para ele é problemático, mas não inexorável. Constata o mundo, não para adaptar-se, mas para mudar. . Percebe as resistências das classes populares como manhas necessárias à sobrevivência. Ex.: o sincretismo religioso afro- brasileiro expressa a resistência ou manha com que a cultura africana se defendia do colonizador branco. Uma das questões centrais é evoluir de posturas rebeldes para posturas revolucionárias que nos engajam no processo de transformação do mundo. Não se trata de impor à população oprimida que se rebele para mudar o mundo. Trata-se de, simultaneamente ao trabalho que se realiza - alfabetizar, evangelizar - desafiar os grupos populares a perceberem em termos críticos a violência concreta. Não como destino ou vontade de Deus, mas como algo que pode ser mudado. O poder dominante tenta inculcar no dominado a culpa pela sua situação. Isso deve ser desvelado também. O educador progressista, entretanto, descarta a -tática do "quanto pior melhor"; nem tampouco deixa relegado a um segundo plano o ensino, transformando a classe num "comício-libertador". » Ensinar exige curiosidade. O educador entregue a procedimentos autoritários dificulta o exercício da curiosidade do educando e tolhe sua própria curiosidade. O bom clima pedagógico é aquele em que o educando vai aprendendo na prática que o limite da sua curiosidade e da sua liberdade é a privacidade do outro.formas de autoritarismo e licenciosidade, que precisamos superar principalmente através do diálogo.
CAPÍTULO 3 -
ENSINAR É UMA ESPECIFICIDADE HUMANA»
Ensinar exige segurança, competência profissional e generosidade. Nenhuma autoridade docente se exerce se não existe a competência profissional. O professor deve levar a sério sua tarefa, estudar, se esforçar para estar à altura dela, ou não terá força moral para coordenar as atividades de sua classe. Outra qualidade indispensável à autoridade é a generosidade. Esta descarta tanto a arrogância no trato com “os outros”, como à indulgência macia no trato com “os seus”. cap. 3 cont... ”. O clima de respeito nasce de relações justas, sérias, humildes, generosas, em que a autoridade docente e as liberdades dos alunos se assumem eticamente. » Ensinar exige comprometimento._Não posso ser professor sem me colocar diante dos alunos, sem revelar minha maneira de ser, de pensar politicamente, sem me submeter à apreciação dos alunos. Não posso passar despercebido pelos alunos e isso aumenta em mim os cuidados com o meu desempenho. Minha presença de professor é uma presença política; não posso ser uma omissão, mas um sujeito de opções. » Ensinar exige compreender que a educação é uma forma de intervenção no mundo. Neutra, a educação nunca foi, é, ou será. Exige do professor uma definição, uma tomada de posição. A intervenção, além do conhecimento dos conteúdos bem ou mal ensinados e/ou aprendidos implica tanto o esforço de reprodução da ideologia dominante, quanto o seu desmascaramento. É o aspecto contraditório da educação. Nem somos seres determinados, nem livres de condicionamentos genéticos, culturais, de classe, de gênero, que nos marcam. Do ponto de vista dos interesses dominantes, a educação deve ser prática imobilizadora e ocultadora. Quando a classe dominante é progressista, o é "pela metade". Ex.: o empresariado urbano pode mostrar-se progressista face à reforma agrária, mas retrógrado diante dos interesses do mercado. O educador consciente e critico não atribui a "forças cegas" os danos que a obediência irrestrita à lei do mercado causa aos seres humanos. Reconhece que não há fatalidade no desemprego e na miséria. » Ensinar exige liberdade e autoridade._Para o professor é dificil, muitas
vezes, caminhar com naturalidade entre a autoridade e a liberdade. É importante se estabelecer os limites, sem os quais a liberdade se transforma em licenciosidade. A liberdade amadurece no confronto com outras liberdades, na defesa de seus direitos face à autoridade dos pais, professores, do Estado. Para exercitar a liberdade é preciso aprender a tomar decisões. É decidindo que se aprende a decidir. É correndo o risco e assumindo as conseqüências das decisões que se tomou. Este processo fundamenta a autonomia. Uma pedagogia da autonomia deve estar centrada em experiências estimuladoras da decisão e da responsabilidade, que constroem a liberdade. » Ensinar exige tomada consciente de decisões._O que cabe ao educador consciente de que a educação não é neutra é forjar em si um saber especial, que jamais deve abandonar: se a educação não pode tudo, alguma coisa fundamental a educação pode. Se a educação não é a chave das transformações sociais, não é também simplesmente reprodutora da ideologia dominante. O educador não pode transformar o país, mas pode demonstrar que é possível mudar, dada a importância de sua tarefa político- pedagógica. » Ensinar exige saber escutar._Quem tem o que dizer deve assumir o dever de desafiar quem escuta para que este fale, responda. O educador autoritário comporta-se como proprietário da verdade e discorre sobre ela, numa atitude intolerável. Sua fala se dá num espaço silenciado. Ao contrário, o educador democrático aprende a falar escutando. Está mais interessado em comunicar do que em fazer comunicados, em escutar a indagação, a dúvida, a criação de quem escutou. » Ensinar exige reconhecer que a educação é ideológica. A força da ideologia fatalista é querer convencer os prejudicados das economias submetidas de que a realidade é assim mesmo, de que não há nada o que fazer a não ser seguir a ordem natural dos fatos. Quando o discurso da globalização fala de ética, se refere à do mercado. Não àquela da solidariedade, a favor dos legítimos interesses humanos. A liberdade do comércio não pode estar acima da liberdade do ser humano. .. O progresso científico e tecnológico que não responde aos interesses humanos , perde a sua significação. A todo avanço tecnológico que ameace mulheres e homens de perder o seu trabalho, deveria haver uma resposta imediata. Pois é uma questão ética e política e não só tecnológica. Não se trata de inibir a pesquisa, mas de colocá-Ia a serviço dos seres humanos. Por causa de tudo isso, como professor, deve-se estar atento ao discurso que proclama a morte das ideologias. Este, sim, altamente ideológico, que ameaça anestesiar as mentes, confundir , distorcer a percepção dos fatos.» Ensinar exige disponibilidade para o diálogo nas relações com outros que não fizeram a mesma opção política, ética, estética ou pedagógica, é no respeito às diferenças, na coerência entre o que se diz e o que se faz que se constrói a disponibilidade para o diálogo. Deveria fazer parte da aventura docente a abertura respeitosa ao outro e a reflexão critica conjunta. A razão ética desta abertura possibilita o diálogo. » Ensinar exige querer bem aos educandos: É preciso descartar como falsa a separação entre seriedade docente e afetividade. A prática docente deve ser vivida com alegria, afetividade, emoção e sentimento .. Sem prescindir da formação científica séria, da clareza política, da luta por seus direitos e pela dignidade de sua tarefa.
Comentários
Postar um comentário